quarta-feira, 1 de junho de 2011

CRAYON

Eu podia falar do tempo mas, tenho medo que me ouça e de castigo passe ainda mais corrido. Saturno nunca teve fama de bondade. Falarei então de certas cores que vão esmaecendo sob o efeito das repetições.

Muda o tempo, conforme a virada das ampulhetas das estações. Quatro damas distintas que em procissão renovam as energias da natureza, de toda natureza. Trazem na barra dos vestidos mais ou menos: poeira, frio, lembranças, outras cores, calor, morte, regeneração, certos bichos que pousam nos quadros e se alimentam deles.

Tudo se passa sobre as telas cujas cores vão esmaecendo. 

As Estações passam, inexoráveis, acenando sua presença e despejando todos esses elementos sobre as cores das imagens que carregadas.

Cansadas de serem intensas, cada qual no seu grau, as cores pedem pra sentar, vão fechando os olhos aos poucos, querendo dormir, e a luz que outrora exibiam portentosas, vai cedendo até partir, deixando sobre tudo a morbidez pálida de vida que se despede demoradamente. 

Antes que chegue essa hora as cores pedem água, poucos escutam. Pedem retoque, restauração, brilho, luz, mais, sempre mais e de novo. Se é de repetição que morrem só lá encontram o antídoto. Todavia, discretas que são, pedem baixinho, não são de muito barulho as cores. O grito mudo que escandaliza os olhos, vem com força na Estação cujo maior volume é o da brisa branda a se esfregar sutil nos lóbulos desarmados.

Tudo elas fazem antes de pedirem pra sentar, avisando bastante que se não apreciadas mudam-se para outras alvoradas. Relegadas aos processos naturais as cores naturalmente morrem. Sem a dieta daqueles já mencionados três nacos de ternura, sem a repetição das palavras que encarnam sonhos, cheias da ausência dos rituais lustradores das íris, são os olhos o filtro a tornar as cores de dentro e de fora opacas e sem gosto, ou brilhantes e renovadas. 

As cores que as vistas observam desmaiarem pedem, numa ladainha rançosa que olhe para elas, que tome tua aquarela nas mãos e traga-as de volta, as cores de mim. Salve-as com o amarelo das declarações amorosas, olha nos meus olhos com a intensidade dos solventes mais poderosos e acaba com minhas dúvidas, toma a tela que compartilhamos e avermelhe-a com a língua despertadora da insensatez pura, querendo escorrer por todo o espaço, mais nada. Saca, discretamente do avental, um tempo para deter-se no carinho róseo-delicado arrepiador de nucas, tira de mim o modelo para tuas fantasias, faz brilhar meus cabelos com o viço do verde que é tua admiração. São tuas as cores que colorem metade das cores de mim. Se for ficar, volta logo, estou secando de saudade.

- Elis

5 comentários:

  1. Texto maravilhoso! Nos faz viajar nesta imensidão "aquarelo-filosófica"! Prosseguimos...

    ResponderExcluir
  2. Saio com a alma aos borrões, respingada de tuas tintas. Ai de quem te descolorir, de quem te puir assim, de tanto não usar teus tons vibrantes. Nada em ti é pastel, bege ou neutro. És morena por convicção. Tomas partido da cor. Nada em ti fica em branco. Nem nada passa em branco por ti.

    Escreve, que isso é uma cor: carbono.

    ResponderExcluir
  3. Faz tanto...tempo.


    As cores podem suavizar ou intensificar, conforme a força que empenhas nas cerdas do pincel. Tanto mais sofre ele com as tintas que escolhemos. Das tonalidades de cinza, pintei o sofrimento. Era a minha maneira de considerar a vida, já que me faltava o azul e o amarelo que anima. O mundo está cheio de cores. Que são brandas ou intensas, desde que nada as gaste. O que não entendo é fato delas desaparecerem a menor contrariedade.


    Elis,
    Te abraço com saudade.

    ResponderExcluir
  4. A paixão esta no ar...
    As vezes agente esqueçe que pinturas são tão reais quanto os modelos nelas inpirados, com o tempo vão perdendo o viço e a juventude, o brilho e o encantamento. Nós humanos envelhecemos mesmo teimando em utilizar elixires da longevidade no rosto ou recorremos as intervenções drasticas no corpo, mas o que abranda ou ameniza a marca do tempo talvez seja o sorriso e as boas lembranças da vida. a Saudade, a lembrança, tudo aquilo que nos deixa prazerosos de termos vivido. A pintura quando ouvida pode ter seu bilho restaurado e renovado e ser mais uma boa lembrança que nos faz querer viver mais e mais.

    Boas lembranças tenho de voce minha jovem amiga,continue perfumando a nós com tas letras.

    Seu amigo, Marcelo Zach

    ResponderExcluir
  5. Colorida, linda e muito lida essa menina.
    Voltar logo
    Logo
    Voltar
    Pra onde?
    Me diga
    E sou capaz de acatar.

    ResponderExcluir

Troca comigo, meu texto pela sua impressão dele ;O)