sábado, 24 de dezembro de 2011

Retrospectante



Acaso não acaso, há encontros que só se explicam pela necessidade de sobrevivência das partes. Alimentam com o essencial. A construção do projeto inteiro de ser e estar compõe-se através dos encontros dessa natureza. Abre-se a porta para compartilhar. Mudanças de perspectiva e alterações de dimensões, como tempo ou espaço, acontecem nesses encontros e viciam, chegando a causar dependência. Quando se vai profundo assim, há abstinência, dói.

Portais que se abrem para novos entendimentos não seriam transpassados sem a mão que aperta a minha. E isso me faz lembrar de tantos gestos. Gentes cheias de significados e intenções, às vezes carregando o sentido de tudo, cuidadosamente encarado com uma relevância surpreendente.

Encontros de olhos que vêem as palavras e sabem da mensagem antes que cheguem à boca, que podem acompanhar a trajetória de um instantâneo à um passado de vida inteira. Para esses, fica pendurada sempre fresca, a sensação exata de ver, ser vista vendo, e poder então oferecer um gomo da fruta que acabou de abrir, dedicada com meio sorriso de ostensiva cumplicidade. E falando assim, flagro, fingindo surpresa, uma parede mais longa que a muralha da China, cheia de movimento.

Não há para vida em comum meio termo, o abraço é aberto, peito com peito, ignora que a carne treme ao ser transpassada pelo amor que aperta forte e respira fundo, aspirando o cheiro da intensidade do desejo de estar junto. Nesses abraços tudo é permitido, que o tempo passe, que se transbordem as lágrimas, que se arrepiem os pelos, que não se queiram largar jamais, que se gargalhe da alegria de completar-se no outro, transloucar-se seguro de que a união conterá sem limitar.

Acontece de escassearem. Encontros são de natureza passageira, veem num episódio e nada garante sua continuidade, nem a eternidade da marca cravada na carne viva dos sentidos, nem a necessidade visceral que pede repetições. Aceitar essa volubilidade, tão fundamental para outros arranjos, seja talvez, o maior dos desapegos. Fica plantada lá, na primeira despedida, uma resignação obstinada que espera pelo possível próximo encontro, raízes profundas, pede mais. Garante que, se devidamente alimentada, será a mais frondosa das árvores. Não se pode nem se quer duvidar, mas o depois nunca tem certeza de nada. Acaso não acaso, pode ser que sim, pode ser que não, mas em sendo, estamos alerta.

Sempre que posso, espalho lembranças no chão, e brincamos muito de viagem no tempo. Só pro caso de o acaso estar ouvindo, saiba que estão ávidas algumas saudades e que ficam a me beliscar querendo reforço para as lembranças. Pode? 

7 comentários:

  1. Não é como mostram os filmes: as cidades grandes e seus arranha-céus espelhados. Não há espelhos. E tudo, mesmo alto, não convida a transcender. Por isso os encontros são caros. Custam a vida interior. Enriquecem-nos quando estão. Mas nos tornam indigentes do outro na distância. Não fosse a teia invisível que permanece, fio umbilical entre as almas, transportando secretamente a substância, morreriam. Ainda bem que pensamentos se comunicam.

    ResponderExcluir
  2. Sabe lá como sintonizar... Nascemos sem dial, a sintonia tem que vir, só pode ser ao natural. Mas não tem satélite que transmita com força igual a este sinal, concorda?
    =)
    Bjs

    P.S.: FELIZ NATAL!

    ResponderExcluir
  3. Eu não tenho palavras. Você é a única pessoa que sabe de mim...além de mim tão bem. Meu silêncio louco...você sabe. Beijos e pode tudo!!! Você pode tudo minha querida!!

    ResponderExcluir
  4. Amiga,

    Seu tim anda cabreiro, de modo que ainda estou entalada com os cumprimentos do Natal aos que se somam esses de ano novinho em folha!

    Desembrulhe 2012 com cuidado e desfrute o presente!

    Amo você,
    - Betinha.

    ResponderExcluir
  5. Belíssimo post. Estava na página inicial de meu blog, o "Coisa Nossa", quando vim aqui para dar uma conferida, após clicar em "Próximo blog". De fato, fiquei impressionado com a qualidade da tua escrita. Parabéns pelo trabalho bem feito!

    ResponderExcluir
  6. Ah, que inveja do/a(s) destinatário/a(s)... =p

    Delicadíssimo texto.

    Beijos, Moça. Saudade paralisante.

    ResponderExcluir
  7. E por que você se exime de estar entre eles? Quem lhe deu essa escolha? Não fui eu! Muita saudade também.
    Beijos

    ResponderExcluir

Troca comigo, meu texto pela sua impressão dele ;O)