quarta-feira, 16 de junho de 2010

PAUSA FELINA


À revelia de tudo que passa em seu entorno, na casa da mulher atarantada, o gato dorme muito aconchegado em si, atrás da máquina. Aproveitando dela o calor, se deixa embalar pelo som das teclas frenéticas em que ansiosa bato.

Flagro-o numa pausa necessária quando assaltada pela incógnita de todos os “por vir” que gostaria, sem ilusões de poder, controlar. Vou até à janela da copa ensolarada, aconchegante, buscando calor, buscando respirar da tranqüilidade que mora no dia, mas fora de mim, e lá ele está. Até então não o vira. Quanto se perde por não parar!
O gato, o tempo todo, respirando devagar, esbanjando beleza no seu existir plácido, elegante, moroso, lá está.

Larga mulher, larga essa necessidade de se antecipar!

O gato amarelo, tigrado, de olhos muito verdes, dorme, sonha de leve, certo do agora e nada mais. Mora na certeza de ser amado, e chora sempre que precisa de afago, vez ou outra o arranca de mim, e ele assim me faz parar. Pausa necessária à manutenção da sanidade que sem esse movimento da natureza não tem como equilibrar.

Sou igualmente amada, por que não moro eu também nessa certeza? Por que não me deixo levar? Porque vou forçando até da vida tomar uns tapas para poder parar?

Tenho também afago, nunca arrancado, mas por vezes suplicado, que vem sempre me salvar, então, por que duvidar?

Sossega mulher, que todos os “poréns” haverão de se solucionar, sem que obrigatoriamente se passe tanto penar.

De óculos, muito séria, pesquisando poesia com ares de fato, sou invadida pela Elisa (Lucinda) em sua furiosa beleza falando da tarde que, apesar de tudo, pode-se contemplar bela, morna, estabelecida na passagem das horas que lhe pertencem. Surpreendo-me de não estar eu mesma fazendo desse tempo o proveito para o qual o reservei fervorosamente, ser.

Larga mulher, larga desse constante pensar, desse constante executar. Vem um bocadinho aqui se espreguiçar, que o tempo não é matéria de se ignorar, ele vai passando e levando o que pra trás você deixar!

- Elis Barbosa

3 comentários:

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  2. essa necessidade de se antecipar... Ah Elis, que delícia saber que nós, essa coisa humana, sentimos coisas parecidas! Eu também tenho um gato, eles sabem de tudo já, não é? A gente que se debate sem necessidade. Como diria um filósofo de botequim, "é pra deixar fluir" e vamos que vamos! Beijo grande. Tati

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  3. Tati, eles sabem de tudo! E com que paciência nos olham, plácidos, quase dizendo, relaxa, vai acontecer. Eu tenho um casal de gatos, amo muito! Pois é minha cara, se ficar forçando a coisa emperra. E lá vamos nós!

    Beijos,
    Elis

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Troca comigo, meu texto pela sua impressão dele ;O)